Gilberto Mendes | 15 de dezembro de 2009 - 18:10

Leia a crônica “Crepúsculos”, por Gilberto Mendes

CREPÚSCULOS

Todas as tardes o casal de idosos sentava-se à frente de sua casa, em duas velhas cadeiras de fio, sem maiores propósitos, para olhar o preguiçoso cair da tarde, a lenta chegada da noite e as pessoas que iam e vinham dos mais diferentes destinos.

Eu passava apressado com os pensamentos sobrecarregados com as preocupações do cotidiano. Sempre os cumprimentava, um aceno de mão, um meneio com a cabeça, e seus olhos e seus sorrisos devolviam-me saudações afetivas e silenciosas.

Pareceu-me que, para eles, estar ali era um ritual dos seus fins de tarde. Entendi que o interesse deles não se fixava nos transeuntes, quem vem, quem vai, com quem vem, com quem vai, estas coisas pequenas que inebria parcela da população – essa parcela que vê na vida do outro mais atrativos que na sua própria.

Oh! Estar ali para eles transcendia a isso. Gostavam era de ver o cair da tarde, o sol se escondendo no horizonte trocando de cores de uma forma mágica: O amarelo meio dia se alaranjando para as cinco horas até vestir-se do rubro ocaso das seis horas.

Ficavam ali em silêncio, sentindo a brisa fresca vespertina que sussurravam poesias esquecidas no vento e captavam desses segredos inspirações diversas para a vida e para todas as coisas.

Ficavam ali até que a lua surgia tímida e pálida e, com o avançar das horas, entusiasmava-se e ganhava formas e aparência singular mostrando-se desinibida.

Algumas pessoas chegam ao final de suas vidas melancólicas e rancorosas e passam a refletir nos outros frustrações que são unicamente suas. O casal de idosos não é assim! Todas as coisas parecem resolvidas para eles, não possuem frustrações em suas existências, viveram do jeito que quiseram ter vivido, e, vivem agora do jeito que querem viver, não lhes interessa o que os outros fazem, eles sabem que somos todos livres e cada qual pagará o preço de suas escolhas.

Tudo o que eles querem agora é viver intensamente uma alvorada, um crepúsculo, um cantar de pássaros, sentir a beleza de uma flor, sorrir para a chegada pacífica da noite. Eles estão no fim e, no fim, estas coisas ganham uma notoriedade estranha à juventude.

De repente, vejo-me longe deles, meus passos conduzem-me para um caminho alheio ao do velho casal. No entanto, eles ensinaram-me algo e este algo me torna melhor. Fecho os olhos, sinto a brisa beijar meu rosto e escuto seus segredos e sua poesia – delicio-me com esta caricia gratuita.

Olho, olho para o sol que se põe, o crepúsculo é lindo e mágico. Eu fico tão pequeno diante disso tudo, os problemas ficam tão pequenos diante disso tudo. O casal fica para trás, perdidos nel mezzo del cammim,  mas eu sigo com eles... Fica-me a certeza plena que, no sentimento, agora e doravante, seremos iguais!!!