21 de outubro de 2004 - 11:07

Artigo "Aprovação dos Transgênicos" de Antonio Néres

APROVAÇÃO DOS TRANSGÊNICOS

 


*Antonio Néres

 

Ao ler o belíssimo artigo, do meu amigo, o ex-deputado federa l(brilhante por sinal) Waldir Guerra, sobre os transgênicos, publicado no início da semana, aqui mesmo, resolvi voltar ao assunto. O tema é por demais palpitante e como ele mencionou, não envolve apenas os interesses  de quem planta, mas do país como um todo e conseqüentemente todos nós.

A atitude e o respeito científico são relativamente recentes no mundo, que, do mítico e do mágico, passa ao objetivo. É um caminho difícil que, até hoje encontra obstáculos religiosos e ideológicos. Não é por outra razão que Michel Servet, ao descrever a circulação pulmonar, foi queimado vivo na fogueira; que por pouco Galileu não teve o mesmo fim; e que a circulação do sangue indicada por Harvey foi considerada 'inútil à medicina, ofensiva a Deus, falsa e nociva à vida do homem'. Todas as questões de manipulação genética, assim como a dos transgênicos, vêm revestidas deste mesmo pano de fundo. A cada novo ciclo científico revivemos uma nova 'Santa Inquisição'.

A reconstrução do genético na humanidade já faz parte de seus arquétipos, seu mitológico, sua consciência coletiva. No início, nos primeiros grupos homídios, o cruzamento entre pais, filhos e irmãos era essencial à sobrevivência da espécie; depois tornou-se, ao contrário, uma ameaça à degenerescência genética e foi excluído das práticas sociais. Após, foi a vez dos cruzamentos das plantas, da busca de mutações que dessem utilidade às mesmas. É exemplo o milho, base das civilizações do Yucatán, no México: de uma minúscula espiga, os maias o tornaram, por cruzamentos genéticos, o mais importante cereal do mundo. Na metade deste século, foi a vez do milho híbrido, questionado violentamente na época, inclusive por aqui. Mas quem hoje não o cultiva?

Recentemente a ovelha Dolly, a decodificação do genoma humano, o suíno light, as vacinas de Oswaldo Cruz, no começo do século passado e também a nova 'guerra santa' contra os transgênicos. Resistentes a pragas, menos consumidores de agrotóxicos. Os transgênicos ainda apresentam a vantagem de incorporarem apenas modificações genéticas desejadas, o que não acontece com o simples cruzamento, elevando a produtividade e baixando o custo dos alimentos. Que se investiguem os efeitos destas mutações ninguém pode discordar, o que já deveria ter sido feito de há muito no milho maia... e nos próprios híbridos; nem que se deixe de investir em um mercado alternativo; mas, mais uma 'guerra santa', por favor, não. A decisão recente de liberar os transgênicos foi inegavelmente um avanço e a agricultura brasileira agradece, todavia precisamos evoluir muito mais. Certamente chegará um dia,  em que aqueles que  vão nos suceder, terão sobre nós a mesma impressão que temos hoje, ao comentarmos sobre as violentas manifestações, até com mortes, contra as vacinas de Oswaldo Cruz ou que Galileu Galillei quase foi queimado vivo, só por afirmar que o a terra girava em torno do sol.

É absolutamente inaceitável, que pessoas sem nenhuma qualificação, desprovidas de qualquer condição para discutir determinados temas como os transgênicos, por exemplo, coloque sua cegueira ideológica a cima de tudo e, de forma irreflexível e irremovível se posicionem contra cientistas com 50 anos de pesquisas, com carreiras acadêmicas inquestionáveis. Pessoas que agem assim prestam um desserviço ao país e conseqüentemente contribui com o atraso que tem atrapalhado o nosso desenvolvimento e a condição mínima indispensável, para a competição com outras nações.

 

O autor é radialista e jornalista