Extra | 19 de agosto de 2019 - 08:41 FACULDADE

Irmãs estudantes de engenharia vendem doces nos trens do Rio para se sustentar

Da cozinha do apartamento de Alice Miler, de 24 anos, no Centro de Duque de Caxias, dá para ouvir o barulho dos trens.

Alice Miller Moraes vende doces nos vagões Foto: Márcia Foletto

Da cozinha do apartamento de Alice Miler, de 24 anos, no Centro de Duque de Caxias, dá para ouvir o barulho dos trens. Além de serem um meio de transporte, os vagões da locomotiva representam, para a jovem, um local de trabalho. É ali que ela vende os doces caseiros produzidos pela irmã, Kezia Miler, de 32 anos. Com o dinheiro arrecadado, dia após dia, as irmãs sustentam a casa e chegam mais perto de conquistar o sonho que compartilham: concluir a faculdade.

Alice e Kezia são mineiras, mas se mudaram para o município da Baixada Fluminense, em 2015, com o objetivo de estudar engenharia de petróleo e gás na Unigranrio. Trabalhar nessa área era um antigo sonho de Alice. De tanto ouvir a irmã falar, Kezia tomou gosto pela profissão. Onde elas moravam não havia universidade que oferecesse o curso. Então, resolveram arriscar.

— Fiz a prova da Uerj para engenharia química e passei. Pelo Enem, fui aprovada no curso de engenharia de petróleo e gás, mas em Campos dos Goytacazes. Só que me disseram que lá era perigoso, e decidi não ir — conta Alice. — Como era o nosso sonho, nós dissemos, “Vamos fazer uma particular mesmo. A gente tenta pelo Fies, pede ajuda, qualquer coisa”. Hoje, estudamos juntas na Unigranrio.

Kezia Miller prepara os doces para Alice vender Foto: Márcia Foletto

e segunda a sexta-feira, Kezia chega às 22h em casa, após a faculdade. Mas ela não vai dormir e nem estudar. Começa a preparar os doces que serão vendidos por Alice no dia seguinte. Kezia fica até as 4h da manhã na produção, que às vezes tem a colaboração da mãe delas, Sirley Miler. Só depois disso vai dormir.

Alice se levanta às 8h e, duas horas depois, embarca em um trem na estação Duque de Caxias para dar início às vendas.

— Bom dia a todos, com licença. Meu nome é Alice, estou vendendo deliciosos doces para pagar as despesas da minha faculdade e da minha irmã — explica ela, que aproveita a abordagem para pedir indicações de vagas de estágio na área de petróleo e gás.

Em pouco tempo surge o primeiro comprador.

— Eu a vejo sempre aqui e gosto de ajudar. Estamos vendo essa situação muito complicada no país, o governo não se preocupa com a gente. Ela é esforçada, é importante ajudar — diz Valdomiro Barbosa.

Qualidade aprovada

A venda dos doces rende, em média, R$ 1.500 por mês. Parte dos ganhos é usada para pagar o colégio particular da pequena Manu, de 6 anos, filha de Alice. O resto vai para os materiais da faculdade e todos os gastos da casa. Como têm o financiamento do Fies, as jovens não pagam mensalidade.

Além de ajudar nos sonhos das irmãs, os passageiros compram os doces pela qualidade.

— Está aprovado, é muito gostoso — elogia o empreiteiro Paulo Duarte.

No cardápio, há duas opções: cone trufado, oferecido com cinco tipos de recheio, que custa R$ 3 (cada) ou dois por R$ 5; e a palha italiana, com dois sabores, que sai a R$ 2 (cada) ou três por R$ 5.

Alice vende os doces de 10h às 17h, fazendo diversas viagens e trocas de trem.

No fim da tarde, ela encerra as vendas e vai para casa se arrumar para ir à faculdade.