Extra | 30 de abril de 2019 - 07:56 ANGUSTIA E MORTES NO HOSPITAL

No Hospital Albert Schweitzer, funcionários lutam por três horas para salvar vidas às escuras

Foram três horas de muita angústia nos 11 andares do Hospital municipal Albert Schweitzer, em Realengo.

Funcionários socorrem pacientes que foram transferidos do Hospital Albert Schweitzer, na noite de domingo Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

Foram três horas de muita angústia nos 11 andares do Hospital municipal Albert Schweitzer, em Realengo. Eram 20h09m de domingo e ventava forte no bairro quando todas as luzes do edifício se apagaram. O gerador da unidade entrou em funcionamento, mas, segundo funcionários, por apenas 17 minutos. Cerca de meia hora depois, foi a vez de acabar a carga das baterias portáteis dos aparelhos usados em pacientes que dependem de equipamentos para respirar. O que se seguiu foram momentos de caos — e de esforço heroico das equipes de médicos, enfermeiros e auxiliares. Eles correram para os CTIs e para a emergência, na escuridão, sob lanternas de celular, para manter vivos os pacientes graves que estavam intubados.

Durante mais de duas horas, eles se revezaram no uso de ambus, dispositivos que fazem a ventilação pulmonar manualmente. Quando um profissional não aguentava mais bombear, outro assumia.

— Durante a falta de luz, houve duas paradas cardiorrespiratórias no CTI adulto, mas conseguimos reverter. A enfermagem foi descendo das enfermarias para o CTI para revezar no uso dos ambus. A bateria dos ventiladores mecânicos seria de duas horas, mas não durou nem meia hora. Isso é resultado de material sucateado e falta de manutenção — reclamou uma profissional de enfermagem.

Paciente morre em CTI

Se do lado de dentro do hospital, a tensão predominava, do lado de fora, a situação não era muito diferente. Angustiados, parentes de doentes buscavam em vão notícias. O motorista Reinaldo Martins, de 28 anos, era um dos acompanhava aflito a correria de médicos e enfermeiros e a chegada de ambulâncias, que transferiram os pacientes mais graves durante o apagão, que durou quase três horas. Ele aguardava notícias do pai, o aposentado Reginaldo José da Silva, de 64 anos, internado desde o último dia 8, após sofrer um AVC enquanto andava de bicicleta. Às 3h, funcionários avisaram ao rapaz que o pai não seria levado para outra unidade.

— Pela manhã, me ligaram e corri para o hospital. Disseram que ele morreu às 6h30m. Mas não acredito. Tenho certeza de que ele morreu durante a falta de luz. Foi muito tempo sem energia — diz Reinaldo. — Nós o visitamos horas antes da energia acabar, e o médico disse que ele estava se recuperando bem.

Reinaldo Martins ficou aguardando em vão notícias do pai na porta do hospital de Realengo Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

Reinaldo contou ainda que, por volta de 1h30m, viu macas com sacos pretos saindo da emergência:

— Mais gente morreu durante esse apagão. Estava um desesperador. Só pararam quando a imprensa chegou.

Enquanto várias equipes lutavam para manter vivos pacientes, uma outra ajudou uma mãe a dar à luz no breu. Os médicos realizaram um parto normal com a sala iluminada apenas por celulares.

Ambulâncias na porta do Hospital Albert Schweitzer, para transferir pacientes em estado grave, na noite de domingo Foto: Bruno Kaiuca / Agência O Globo

No dia 14, seis dias após um temporal deixar dez mortos na cidade, o prefeito Marcelo Crivella anunciou novos protocolos de ação. Entre as medidas, está a “verificação do abastecimento dos geradores nas unidades pré-hospitalares e hospitalares”, “com destacamento de uma equipe de prontidão”. Ele ainda recomendou que unidades particulares e públicas de outras esferas de governo fizessem o mesmo.

A Secretaria municipal de Saúde afirmou que “em nenhum momento, qualquer aparelho da UTI deixou de funcionar” e que não houve óbitos relacionados à falta de luz. O órgão confirmou que pacientes tiveram que ser transferidos, sem revelar, no entanto, quantos foram. Em nota, disse também que os geradores foram acionados e atuaram durante uma hora. Segundo a secretaria, os aparelhos pararam de funcionar quando entrou água de chuva nos tanques de diesel dos equipamentos. O hospital alugou dois geradores, que seriam instalados na noite deste segunda-feira. Sobre Reginaldo José da Silva, informou que seu estado era “gravíssimo”.

A Light, por sua vez, informou que a queda de árvores na rede afetou o fornecimento e afirmou que “é importante esclarecer que todos os hospitais devem possuir um gerador para garantir fornecimento ininterrupto de energia, mesmo quando houver ocorrências na rede da distribuidora”.

O Instituto Médico-Legal também foi afetado e ficou sem luz por 17 horas, prejudicando necropsias.