"Convivendo com as Diferenças". Diversidade Étnica - Um olhar sobre o atual Povo Afrobrasileiro e suas origens.
“Vocês podem continuar a explicar a história como sempre fizeram, somente, atenção: [...] existem contornos bizarros que não são percebidos.” Michel Foucault.
No dia 09 de outubro fui convidado pela diretoria da Escola Estadual Vicente Palloti a levar uma palestra sobre a Diversidade Étnica dentro do Projeto "Convivendo com as Diferenças". As palestras ocorreram, de manhã, à tarde e a noite. Na manhã, falando sobre os processos históricos da escravidão e exclusão social da etnia negra brasileira, dividi a palestra com o igualmente teólogo e pós-graduando em filosofia, sociologia e religião, Guilherme Alexandre Monteiro. Segue uma síntese da palestra.
O Brasil é um país com grande diversidade étnica, sua população é composta essencialmente por três principais grupos étnicos: o indígena, o branco e o negro.
Após quase quatro séculos de uso da mão – de obra - escrava, na data de treze de maio de 1888, a princesa Isabel, ocupando o trono na ausência de seu pai o Imperador D. Pedro II, o qual estava em viagem a Europa, usando de suas atribuições promulgou a seguinte Lei, lida na sessão da Câmara dos Deputados, pelo então Ministro da Agricultura Rodrigo Silva constando de dois artigos, a saber: “Art. 1.º É declarada extinta a escravidão no Brasil. Art. 2.º Revogam-se as disposições em contrário152”.
Nas poucas palavras da Lei Áurea, depois de muito sangue, suor, lágrimas derramadas e vidas ceifadas, estava oficialmente abolida a escravidão no Brasil. Mas a liberdade não veio acompanhada pela igualdade. Durante quase 400 anos o povo negro foi à mão e os pés do Brasil. Após a abolição ele foi abandonado à própria sorte. Não é por acaso que ainda hoje as estatísticas mostram que a maioria do povo negro é pobre e miserável. Tudo isso como veremos a seguir é consequência de uma ação estatal.
Ideologia do branqueamento
A política de imigração adotada depois da abolição legal do trabalho escravo foi durante muitos anos, marcada de matizes racistas e orientada pela ideologia do branqueamento. O decreto de 28 de junho de 1890 determinava que agentes diplomáticos e consulares brasileiros e a policia dos portos deveriam impedir a entrada de criminosos, mendigos, indigentes e “indígenas da Ásia e da África”. Somente o Congresso Nacional podia permitir alguma exceção. O Decreto-Lei nº 7967 de setembro de 1946 determinava que “os imigrantes serão admitidos de conformidade com a necessidade de preservar e desenvolver o Brasil, na composição de sua ascendência européia”.
O projeto migratório, incentivado e promovido pelo governo imperial, obedecia a três finalidades principais: branqueamento da população brasileira, procurando dessa forma deter o avanço da negritude, decorrente de numerosos contingentes de escravos trazidos da África.
Em 1921, foi apresentado o Projeto Lei nº 209, de dois deputados federais de Pernambuco e de São Paulo, proibindo “a imigração de indivíduos humanos das raças da cor preta”. Em 1923, voltou à mesma insistência, desta vez proposta por um deputado federal de Minas Gerais, limitando “a entrada de qualquer colono de raça preta” a uma cota anual de não mais de 3% dos orientais já radicados no Brasil. Embora estes não tenham sido aprovados, a prática, porém não permitia mais a imigração de negros para o Brasil -Os principais argumentos aduzidos eram os seguintes: a) a população negra diminuiria progressivamente devido a alta taxa de mortalidade, maior incidência de doenças, menor índice de natalidade e desorganização social dos negros; b) a miscigenação produziria naturalmente uma população mais clara, uma vez que o gene branco era mais forte, c) a imigração orientada reforçaria a predominância branca.
Infelizmente os que tanto lutaram pela abolição do povo negro escravizado, não lutaram também com a mesma tenacidade para que ocorresse sua inserção a sociedade brasileira como gente livre. É por isso que os afro-descendentes brasileiros afirmam que a abolição ocorrida a 13 de Maio é ainda um projeto inacabado. Lamentavelmente, não há muitos documentos dessa triste página da História do Povo Negro e do Brasil, pois Rui Barbosa, (1849 - 1923), na função de Ministro da República, “mandou queimar todos os arquivos da escravidão, onde estava registrada a quantidade de negros trazidos para o Brasil e preço de cada um. Isso, independente da intenção, privou a história de importantes documentações.”
Para muitos intelectuais, principalmente negros, a escravidão negra tem sido um vasto campo de pesquisas, mas para que a História da resistência negra seja originalmente resgatada é preciso que os afrodescendentes participem, acima de tudo não negando suas raízes, cultura e principalmente ancestralidade. Só assim poderão ajudar a recontar a história como ela realmente ocorreu, trazendo reparação no presente, tendo em vista um futuro digno e justo. Isso é possível a partir da releitura do maior e mais fidedigno dos livros, que é a memória ancestral, passada de geração em geração.
À noite, o ciclo de palestras foi encerrado com a apresentação de jovens representantes da cultura afro. Liderados por Fernando Senkapuz RDZ, os artistas, dançarinos, grafiteiro por meio do RAP, Hip Hop, Grafite, Disputa de Rimas, falaram sobre a origem e apresentaram alguns aspectos desses elementos componentes da vasta cultura afro-brasileira.
Parabéns ao quadro docente e discente da Escola Estadual Vicente Palloti. É conscientizando as crianças e jovens de hoje sobre o valor do outro, do diferente, que construímos uma sociedade justa, equitativa e solidária, afinal: "Você só é você pelo fato de o outro ser o outro. O outro é diferente igual a você. Tudo é uma questão de aceitação e alteridade. O eu só pode existir pelo fato de que existe o outro. Assim sendo a diversidade se celebra na aceitação de que eu preciso do outro para existir como sou, e ele precisa de mim para existir como é."
Reverendo José do Carmo da Silva
BIBLIOGRAFIA
CNBB. Ouvi o clamor deste povo. Campanha da Fraternidade 1988, texto – base. Editora Gráfica Ipiranga LTDA. AZZI, Riolando. O Altar unido ao trono. Um projeto conservador. História do pensamento católico no Brasil – III. São Paulo. Ed. Paulinas 1992.
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