“Ele é cruel, muito cruel”. A frase nasceu por acaso e é apenas uma das tantas que marcaram a carreira de Januário de Oliveira. Se a narração de futebol na TV, até hoje, é permeada por bordões, ele é um dos “culpados”. “Cruel”, “sinistro”, “Super Ézio” e “tá lá um corpo estendido no chão” são apenas alguns exemplos das tiradas desse gaúcho de Alegrete. Aos 70 anos e afastado das transmissões desde 1998, ele continua acompanhando o futebol, mas, hoje, por causa do diabetes e a visão bem prejudicada, apenas de casa. Cego do olho direito, ele agora tem dificuldades para enxergar do olho esquerdo. Isso não impede que Januário perca o bom humor: com uma memória afiada, ele relembra os grandes momentos da carreira de sucesso. E emociona.
Em entrevista ao UOL Esporte por telefone, Januário, hoje morador de Goiânia, falou sobre o caminho que o levou ao futebol. Fã da modalidade, ele começou sua trajetória fazendo rádio-novela, em 1963. Foram seis meses como ator antes de pintar uma brecha no esporte, na rádio Cultura de Bagé. Tinha início, ali, quase 40 anos ligados ao mundo da bola. O namoro com o rádio foi até meados dos anos 80, quando foi levado por Sérgio Noronha para a TV Educativa, no Rio de Janeiro. Em 1990, foi para a TV Bandeirantes, emissora na qual trabalhou até 1998, quando a doença o obrigou a se aposentar.
Os bordões
“É engraçado, nunca imaginei antecipadamente o que eu ia usar. Nunca pensei ‘essa frase é boa e posso dizer isso em uma transmissão’. Tudo aconteceu no estalo”, disse Januário. Foi assim, de sopetão, que surgiram frases ainda hoje marcantes. “Vi os homens da maca entrando em campo e disse ‘olha aí o primeiro carreto da tarde’. O pessoal achou engraçado. Aí tinha um jogador caído, e falei ‘tá lá um corpo estendido no chão’. Isso também ficou famoso, virou até música, uma do Gabriel, o Pensador, outra do João Bosco.”
Cada bordão surgiu de maneira curiosa. “Eu estava transmitindo um Flamengo e Sport, e o Mozer, zagueiro, recuou uma bola para o Gilmar. A bola passou por entre as pernas dele, devagarinho. Foi um frango fantástico, a bola indo fraquinha para o fundo do gol. E eu falei ‘Gilmar, sinistro, muito sinistro’.”
E o cruel? “Foi em um jogo do Dener no Vasco, em São Januário. Ele fez quatro gols e deu passe para outro. No quarto gol, ele pegou uma bola no campo do Vasco, deve ter driblado uns oito jogadores, teve gente que ele driblou duas vezes. Aí eu comecei a narrar ‘maravilhoso, fantástico, grandioso’, fui usando todos os adjetivos, mas acabaram os adjetivos, a língua portuguesa encolheu pra mim. Aí veio um Dener foi ‘cruel, muito cruel’. E assim nasceu”, lembrou Januário.
O narrador criou ainda “sobrenomes” para alguns jogadores, como Charles “Guerreiro” e Valdeir “The Flash”. “Ele era só Charles. Quando ele foi para o Flamengo, tinha o Charles, atacante, aquele que jogou no Bahia e no Boca Juniors. Aí virou ‘Charles segundo’. Como o espírito dele era de guerreiro, comecei a chamá-lo de Guerreiro. Até quando o Parreira o convocou para a seleção, ele falou ‘Charles Guerreiro’, do Flamengo. Ele até adicionou o “Guerreiro” no nome dele”, disse. “O Valdeir… Passava a série na TV Globo, e ele chegou correndo que nem um louco no Botafogo. Eu o chamei de ‘The Flash’. Hoje, até o filho dele o chama de ‘The Flash’.”
Os bordões criaram até uma situação curiosa para Januário. Certa vez, ele foi parado por um carro na entrada do Barra Shopping, no Rio. Uma senhora de cabelos brancos, "seguramente com uns 90 anos", o reconheceu, desceu do carro e deu uma "bronca" no narrador. "Sou torcedora do Flamengo e fico doente todas as vezes que você chama o Sávio de Diabo Louro. Não chama ele de Diabo Louro, ele é tão bonitinho. Ele não tem aspecto de Diabo, tem uma carinha de anjo", disse a senhora para Januário. "Tentei justificar que ele infernizava as defesas, mas não deu certo. Então falei para ela que, a partir de domingo, não ia mais chamá-lo de Diabo Louro, mas sim de Anjo Louro da Gávea. Hoje, até a esposa do Sávio chama ele de Anjinho.
E quais os bordões mais famosos? “A gente ouve até hoje o ‘tá lá um corpo estendido no chão’. Para a torcida do Fluminense, o que mais marcou foi o Super Ézio.
Super Ézio, um capítulo à parte
O único bordão “sugerido”para Januário veio em um almoço com um amigo na semana antes de um clássico entre Botafogo e Fluminense. Curiosamente, se tornou um dos mais clássicos da carreira do narrador. “O Fluminense era muito ruim na década de 90, mas ainda assim o Ézio era artilheiro do Carioca. Eu estava almoçando com um amigo flamenguista, e disse para ele que tinha que ser herói, como o Ézio, para fazer gol pelo Flu. Ele falou ‘herói, não, super herói’. Aí, dois minutos depois, abre a porta do restaurante e entra o Ézio. Ficamos ali, brincando com ele, com o lance de super herói.
Chegou o clássico, e o Fluminense fez 1 a 0 com Ézio. Em seguida, o atacante voltou a marcar, e Januário emendou um “Ézio, o herói tricolor, 2 a 0, nasce o super herói tricolor, nasce o Super Ézio”. “A torcida gostou. A repercussão foi enorme e, sempre que falavam com ele, falavam de Super Ézio.”
Começava uma amizade que durou até a morte do artilheiro, em novembro do ano passado. “Depois de um Atlético-MG x Fluminense, ele se despediu do futebol, mas não fez alarde, não falou para ninguém. Eu apresentava um programa de debates na TV Educativa e, no fim do programa, estava lá o Ézio com a mãe, a irmã, o cunhado, a noiva, enfim, ele tinha trazido a família inteira dele do Espírito Santo para assistir ao último jogo dele como profissional. Ele levou todo mundo na TV só para me apresentar e me dar a camisa que ele tinha acabado de usar, que eu guardo até hoje com muito carinho. Nessa noite, ele me deu o celular, o telefone da casa dele, e a partir daí não perdemos mais o contato. Mesmo meses antes de ele falecer, a gente se falava. Nos tornamos grandes amigos.”
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“Eu me aposentei em 1998, por causa do diabetes, que começou a prejudicar a minha visão e não permitiu que eu trabalhasse mais. Fiz duas cirurgias, perdi uma das vistas na primeira. Tive retinopatia diabética, mas, quando
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